Ir. Cristina, FMA (poesias)


Brinco Dourado


Quando o silêncio irrompeu altivo
E o recinto esvaziado foi
Encontrei no canto da sala recolhido e sóbrio
O velho intacto brinco dourado
Uma antiga jóia guardada
Presente de minha avó amada
Que eu esfumacei da lembrança

A antiga jóia não mais polida
Repousava solitária no empoeirado porta-jóias da emoção
No canto escuro da consciência
No aposento escondido do esquecido.
Ao passar distraída
Quebrei a tampa da caixa antes perdida
E me feri com os estilhaços amados

Banhada em sangue vertido
A querida jóia esquecida
Emergiu do silêncio, escapou do caos.

Recupero a beleza escondida
Dessa jóia querida
Que são os sonhos da vida
E mesmo que a mantenha escondida
Com a alma em cacos dividida
A antiga jóia não mais polida
Brilha ainda que empalidecida
Brilham os sonhos que guardei no porta-jóias
Que guardei desde menina.

Cristais







Suspirando pela delicadeza da Vida

Esbarro nos olhos daquele que é dela o feitor

Diante de seus olhos límpidos

A alma fica transparente

Se descortina no teu amor

E a alma transparente

Tem a consistência de Cristal

Tão clara e delicada

Ele a toma em suas seguras mãos

E me sinto tão segura, tão amada!

Quem pode reconstruir cristal quebrado?

Alguém já o pode colar?

Descobri que sonhos são como cristais

Também quebram!

Depois que o meu quebrou,

A alma ajuntou tudo e decidiu reconstruir

A alma doce agora ilumina o mundo

O mundo sente Deus

Depois dos cacos amargos

Frágeis cristais.






Nas sendas do íntimo onde nescem os ventos
Decortina-se o mistério velado pela Sombra
Ainda não amanheceu
E a aurora o mistério anseia
E a moça pergunta ao mistério: Por que semeaste vento?

Enquanto amanhece
E o vento sopra forte em seu cabelo
A sombra se aproxima do mistério
Onde morar mistério?
Por que te econdes?

Deixa amanhecer amado mistério
Deixa aclarar o escondido
Ainda é inaudito onde o vento nasce
Ele se assombra ao avançar da sombra
Quando amanhecer eu te verei claramente
A Sombra aclarará o mistério...

Frágil Vitral...



Segredos da Solidão Habitada





Enquanto se cala o beijo amargo do silêncio
E o turbilhão do sentimento adormece
A mesa farta se esvazia por completo
E sobra apenas um resto de verdade

É no cálido momento do sem instante preciso
Que a boca cala e os olhos quase cerram-se
Que o resto que sobrou da verdade
Escapa como filetes de água entre os dedos
E mesmo a consciência mais pura é capaz de acusar-se

Aqui, no raro instante da consciência indivisa
Não há nem anjos e nem demônios
Só a limpidez dos olhos marejados pela ferida aberta
E um resto de compaixão

Ainda que a alma mais pura
pudesse rasgar o véu e abrir o livro lacrado
Ainda que o fogo adormecesse e só sobrassem cinzas
Ainda que como água ela escorresse dos meus dedos
Ainda sim eu procuraria minha própria verdade.

Uma remota vez, quase perdida no inconsciente
Ouvi um sábio falar
Que deveria sentir o mundo não apenas com o coração
Mas com todas as vísceras
E é assim que eu sinto....e isso talvez me defina

Contorço-me entre passagens de larvas em brasa
E gélidos caminhos de vento e frio
Na corda bamba das vicissitudes
Eu, equilibrista de mim mesma,
Levanto as pálpebras por vezes cansadas
E contemplo a profundidade do silêncio

Na tranquila calmaria
De quem enfim pode ter-se nas mãos
E então olhar-se fundo nos olhos
Capaz agora sou de definir-me:
Dinamismo, fogo, amor e paixão por viver!